Por Felipe Bueno
“Não posso deixar você filmar aqui. Tudo aqui é contravenção”, diz o gerente de uma das casas de prostituição da rua Guaicurus, após tentativa de entrevista com uma prostituta. Bruna é o nome dela. Depois de muito insistir, ela topou timidamente falar sobre o seu trabalho. Porém, os equipamentos de vídeo assustaram um dos homens que gere o prostíbulo. “Não. Eu não posso deixar vocês filmarem. Também não posso acompanhar vocês na entrevista, estou trabalhando”, responde o homem mesmo com a afirmação de que a reportagem não era uma denúncia e de que ele poderia observar.
Na mesma zona – termo popular para designar os bordéis -, homens andam pelos corredores largos, de uma extremidade a outra, onde se encontra os quartos. A cada porta uma mulher diferente, com sua história diferente. Quando não estão com clientes, elas ficam se exibindo da porta, vendendo a imagem que têm. Algumas estão completamente nuas em cima da cama, numa posição que sugere o ato sexual, mas essas, por meio do semblante, parecem tristes. As mulheres na porta, essas sim parecem que estão dispostas a fisgar um cliente.
“Poxa! Hoje eu não ganhei nada. Me dá um cigarro”, brinca uma das prostitutas com um homem e já aproveita para garantir o programa, “quero uma pistola também”. Ela estava de calcinha e seios a mostra. Enquanto isso, no quarto em frente, uma prostituta faz um movimento na língua que vai do seu lábio inferior ao superior repetitivamente. Seu nome de guerra é Luna. O ar carregado por um cheiro que mal dá para respirar.
– Quanto é o programa?
– É dez. Vem, vamos fazer.
A conversa se inicia com o mínimo de formalidade necessária, já dentro do quarto. Prostitua há 10 anos, Luna, 40, não quer ser identificada na entrevista com seu nome verdadeiro. Ela hoje vive com um homem, estão juntos há 2 anos. Segundo ela, seu cônjuge não sabe que ainda continua fazendo programa. Sim, eles se conheceram no bordel. “Vim do interior de Minas para Belo Horizonte quando tinha uns 30 anos. Não conseguia achar emprego nenhum. Parecia um cerco. Comecei a ficar angustiada”, explica Luna como e porque começou a se prostituir. “Meus pais sabem, meus irmãos também”, diz.
Quanto à família, ela se sente tranquila e amada. “Minha mãe é muito religiosa. Expliquei para ela, disse que ia continuar sendo a filha dela. Hoje ela conformou. Mas sei que gostaria de me ver fazendo outra coisa”, relata. Dentro do seu quarto e sob uma luz vermelha, os olhos e seios de Luna saltam para fora. Ela está vestida com uma lingerie preta e calçando uma bota com um salto grande. Enquanto fala, mexe o cabelo o tempo todo e olha fixamente para o zíper da calça, às vezes, subindo o olhar.
Para ela, existe uma vida dentro e fora dali. Diz nunca ter sofrido preconceito, mas para ela a prostituta e o gay são os mais explorados. “A gente passa por algumas coisas ruins. Da mesma forma que o homem explora a prostituta, tem homem aí que fica com gay e explora”. Entre os fatos engraçados, ela lembra, fazendo cara nojo e rindo, de um caso, “meu segundo cliente era um homem muito sujo. Seu pé estava todo incrustado de sujeira”.
Estudante do curso técnico de enfermagem, ela vê o ofício como uma profissão futura. “Antes tinha uma fila enorme de homens querendo ficar comigo. Hoje, não que eu não consiga mais viver disso, mas a procura diminuiu. Vai chegar um momento que eu não vou mais poder fazer programa”, argumenta. Ela também tem o sonho de construir um centro de beleza.
– Você já sonhou algum dia casar-se, ter filhos?
– Sim, claro. Toda pessoa quer casar na vida. Ninguém quer ficar sozinho. O que acontece hoje é que as pessoas não estão se amando, casam por outros motivos. Parece que se casam para se separar. – explica Luna que toda mulher tem esse sonho uma hora da sua vida. E ter filhos? Ela responde apenas sim e faz um gesto com a cabeça que reproduz a afirmação.
– Você já usou drogas?
– Não, nunca usei. Tem duas coisas que atrapalham uma vida de prostituta, é a droga e o cafetão. Tem mulher que trabalha o dia todo e que no final não lhe sobra nenhum dinheiro, pois gasta tudo na droga ou os cafetões tiram tudo. – Você já foi explorada por algum cafetão? Ela responde apenas que não.
– 10 reais?
– Sim.
– Você sabe de alguma prostituta que tope dar entrevista em vídeo? -. Luna sai de seu quarto para conversar com uma de suas colegas. “Vou te apresentar a uma menina, acho que ela topa”. Ela bate na porta que se abre imediatamente, em seguida diz, “Bruna, conversa com esse menino aqui”.